Questão 1
Imagem – à flor da pele?
No filme “Amor à flor da pele”, de Wong Kar-wai, uma sequência de cenas em que um casal se encontrava em segredo (há bastante tempo) apresentava a mulher em diferentes vestidos. As imagens da mulher, a cada cena com uma roupa de cor diferente, é que davam a sensação de que o tempo estava passando; aliadas à imagem da fumaça do cigarro do homem se dissipando no ar.
O espectador percebia a passagem do tempo através das imagens, assim como nós percebemos o mundo e produzimos materialidade a partir delas (BERGSON, 1999).
Pensando com Deleuze, a imagem é um corte no caos para podermos existir, não havendo diferença entre imagem mental e sensório-motora, nem entre virtual e real.
Para Bergson, sem as imagens não seria possível apreendermos as coisas, pois o mundo é um conjunto de imagens. O autor faz uma distinção entre os dois tipos de imagens: a imagem da sensação vivida no presente e a imagem virtual do passado. As imagens-lembrança (do passado) interferem na apreensão das imagens no presente. O que percebemos encontra-se no entre – entre as imagens percebidas e a lembraça.
A memória, praticamente inseparável da percepção, intercala o passado no presente, condensa também, numa intuição única, momentos múltiplos de duração, e assim, por sua dupla operação, faz com que de fato percebamos a matéria em nós, enquanto de direito a percebemos nela (BERGSON, 1999, p. 76).1
É difícil dizer onde a percepção acaba e onde a lembrança começa. As imagens-lembrança enriquecem a experiência do presente. Mas não seriam, também, as próprias imagens-lembrança influenciadas pela experiência do presente, pelas sensações? Pois, como nunca somos os mesmos, a memória poderia também ser (re)inventada de forma diferente no presente. Em uma cena final do filme comentado anteriormente, a memória é apresentada como “um vidro embaçado”, sendo que, depois do relacionamento desfeito restavam apenas o segredo e a lembrança.
Pensando com Barthes em que a imagem é modo de comunicação, funcionando como meio para outra coisa, como um signo e, ainda, com Umberto Eco em que a Obra é aberta, permitindo inúmeras interpretações e a criação de diferentes proposições a partir dela, podemos dizer que a imagem afeta, produz sentidos, sensações; havendo (com Deleuze) uma infinidade de possibilidades, o que a distanciaria do sistema binário, classificatório e subjetivante.
Questão 2
Doações do Corpo
Zenilda Cardozo realiza nos meses de julho, agosto e setembro a ação artística intitulada: Doações do Corpo, em que a artista fará a doação das obras que representam os seus próprios órgãos. A ação faz parte do Programa Doações do Corpo: interface entre o sistema de transplantes de órgãos e tecidos e o circuito de artes.
A ação é aberta à participação do público e poderá ser acompanhada pelo blog: http://doacoesdocorpo.
A artista mimetiza, através da ação artística, os processos de seleção adotados pelos dois sistemas (o das artes e o dos transplantes), problematizando as questões sobre o corpo na atualidade, além da fragilidade do próprio corpo e sua obsolescência. A ação também propõe tensionamentos no circuito da arte contemporânea, questionando seus espaços expositivos e os critérios de seleção para suas ocupações. O corpo frágil também é evidenciado na confecção dos órgãos/obras, pela forma e material utilizados.
Questão 4
Notas:
1 Minimalismo – Movimento da arte dos anos 1960 em que o objeto artístico era desprovido de uma essência, sendo apontado como parte de algo maior, considerando o local (entorno), o sequenciamento (uma coisa depois da outra) e a modulação (arquitetura e mobiliários se tornavam modulados). O objeto não significava além dele mesmo. Ver também Rosalind Krauss – Caminhos da Escultura Moderna, São Paulo: Martins Fontes, 1998.
2. Happening – Manifestação artística dos anos 1960 e 1970, em que aconteciam, ao mesmo tempo, diferentes proposições, de diferentes modalidades, como: pintura, dança, música, teatro, literatura, etc. O público era convidado a participar das ações, que eram efêmeras e problematizavam, entre outras coisas, a materialidade e o mercado da arte. Assemblage – “uma nova forma de colagem”(Glusberg, GLUSBERG. Pré-história do gênero/A realidade do desejo. In: A arte da performance, p31).
Zenilda Cardozo Sartori
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