segunda-feira, 13 de julho de 2009

Primeira prova enviada para publicação

MESTRANDA: MÁRCIA BARCELLOS ALVES

# SEQUÊNCIA ESCOLHIDA: 2 – 4 – 7

2.

- ARTISTA: Carlos Maximiliano Fayet

- OBRA: Deusa Themis

Durante por volta de cinqüenta anos, caminhantes distraídos que circulavam na Praça da Matriz, no centro de Porto Alegre, esbarraram seus olhares em uma gigantesca parede de concreto. Cinza, gélida e séria, a construção do Palácio da Justiça – projetada e executada por Carlos M. Fayet e Luis F. Corona – emanava também pomposidadem poderio e maestria.

Hoje, o cenário não é mais o mesmo. Há quatro anos o prédio recebeu um ‘adorno’ que desde então faz toda a diferença: uma Deusa foi lá posta a reinar.

Os nove metros da escultura de bronze chamam a atenção não só pela beleza que conferiram ao prédio, enquanto uma fenda que faz o bloco maciço respirar, mas também pela criatividade e ousadia que envolve a criação, por sua potência interrogativa.

Themis, a Deusa da Justiça, também não é mais a mesma. Fayet tirou suas vendas – a ‘justiça-eira’ não é mais ‘cega’, ela tem olhos bem abertos, cabelos esvoaçantes como os de uma guerreira e tem a intimidade de um de seus seios posta à mostra. Em seus braços e sob seus controle não tem mais uma balança que não sabe pra que lado pende, traz agora consigo a capacidade de uma espada e a sabedoria de um livro (onde lê-se L E G E S).

E eu, sentada no banco da praça, posso sentir a pulsação desta Obra. Em mim, a pulsação transcende a palavra, embora não a silencie. Pelo contrário, ‘in-quieta’, transborda da pedra e produz uma espécie de grito só escutado por aqueles dispostos a tanto.

A arte de Fayet teve, neste momento, força para torna-se ‘monumento’. Esta obra-força-vibração fez , no centro-coração da cidade, meu Porto ficar mais vivo e muito mais Alegre.


4.

> JUÍZO ESTÉTICOAvalia-ação, inerente ao sujeito, sobre o valor estético de algo. Este valor é sempre suposto, sobreposto. O ‘valor’ intrínseco à obra incide sempre em um sistema moral, já que o gosto também é forjado por uma estrutura cultural que define a forma. Este ‘juízo’ só pode ser debatido se houver um distanciamento da obra e, por depender do gosto (e ser intuitivo), não pode ser questionado. O ‘juízo estético’ opera na singularidade do objeto em questão; não é julgamento, pois é espontâneo e involuntário. Está relacionado a uma experiência estética.

> PERFORMANCE – Ação artística-criadora que se efetiva e desaparece, ainda que seus efeitos possam permanecer ecoando. É espetacular, destrutiva; Acontece num tempo-lugar e de uma forma que acaba por desaparecer, expirar, fenecer. A performance está no artista, não no objeto; Transitoriamente, o próprio artista torna-se obra.

> HAPPENING – Ao contrário da performance, o happening é interativo e construtivo. Envolve materialidade e ação; está relacionado com atividade, acontecimento, instalação. Quando acontece, re-constrói, confunde.

> HUMOR – Deleuse, em ‘A Lógica do Sentido’, diferencia humor de ironia. O humor é corpóreo, é produzido molecularmente a partir das afecções dos encontros. Embora seja mais sério que a ironia, o humor ri e chora de si mesmo. Sua ‘postura’ faz com que a moral da cultura seja posta em cheque sem argumentações, meramente pelo o que ele desestabiliza. É fluxo, ação, devir, é uma secreção que mostra a falta de sentido das coisas e ri disto. É o que interessa para a filosofia da diferença.

OBS: Todas estas palavras ainda dizem muitas coisas para mim, mas considerei interessante o exercício de conceitualizá-las, dá-las um contorno. São conceitos interligados numa lógica de pensamento nova para mim, o que faz com que algumas abreviações possam ser interpretadas como contrárias à complexidade e amplitude que cada um desses conceitos guarda e revela.


7.

As três questões que compõem esta maior resumem algumas das mais importantes inquietações que este seminário produziu para mim. A tentativa de responde-las significa a ânsia de poder dar um contorno a algo que é muito mais potente enquanto questão. Por isto, os ‘contornos’ que se seguem se sabem incompletos e têm a intenção de compartilhar algumas das ressonâncias destas perguntas.

Há pouco, falava de Fayet e da Deusa Themis – tenho empreendido um esforço no meu projeto de pesquisa que é o de pensar o direito a partir da psicanálise. O direito surge para dar conta das fragilidades humanas e foi só com o tempo que ele também descobriu-se também eminentemente frágil.

O que a fragilidade da justiça, explicitada todos os dias em casos abordados pela mídia, tem a ver com as mudanças na imagem da sua Deusa, pensada por Fayet? O ‘autor’ quer dizer algo quando cria? Toda arte é conceitual? Aliás, quem é o autor: Fayet, Corona, a filosofia, o povo (já que se trata de uma figura mítica)? Por que a Deusa só agora pôde ser mostrada-vista desta forma? O que torna uma imagem, arte? Como falar do que este intempestivo da arte produz em quem a olha?

*****

Derrida tem um conceito que as reflexões sobre arte e justiça remetem-me a todo tempo (e que por isto comento aqui) e que de alguma forma traduz outras interrogações que tomaram força nesse cenário. No livro ‘Força de Lei’ ele fala sobre para ele chama-se de ‘performance’, de ‘ato performativo’. Este conceito traduz a potência criadora da palavra – interessante pensar que o ‘ato’ de um Juiz ou Padre ‘dizer’ que um homem e uma mulher, por exemplo, sejam marido e esposa, faça com que eles de fato assim os tornem. Como pensar o ‘ato criativo’ da arte e da palavra?

Compartilho a questão e deixo as conseqüências dos seus desdobramentos para um próximo seminário, já que a psicanálise (pelo menos a que eu conheço – e que cada vez mais conheço a diferença com relação a outras formas de concebê-la) tem muito a dizer sobre isto.

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